Carta aberta no seu mês de aniversário

Querida filha…

Ainda que me encante a felicidade de fevereiro e o clima de outubro, para mim nada se compara a Dezembro. O último mês do ano me deixa completamente apaixonada e você provavelmente vai reparar que em Dezembro eu tenho o costume de olhar para o céu, sorrir sem motivo e ter algumas ideias estúpidas como dançar no meio da rua.

Para completar Dezembro ainda tem você. Em um dia 28 de Dezembro você chegou. Porque não basta que duas das minhas festas favoritas fiquem a apenas uma semana de distância uma da outra, para completar no meio tinha que ter você. Mais um motivo para comemorar, mais uma desculpa para reunir todo mundo que a gente gosta, mais uma razão para eu enlouquecer de correria e felicidade.

Eu nem sei se a sua objetividade capricorniana te permitirá ver com os olhos de mágica que eu vejo Dezembro – embora, coincidência ou não, a maioria dos capricornianos que eu conheço se permitam ficar mais emocionais nessa época do ano – mas de qualquer forma, seu ascendente em Peixes está aí para te deixar mais avoada, esperançosa, viajada.

Eu espero, então, que você consiga ver realmente os presentes que irá ganhar nessa época do ano. Dezembro vai te trazer muito mais do que um natal, um aniversário e um ano novo para fechar com chave de ouro.

Todo ano Dezembro vai te dar calor e a princípio umas boas férias. Dezembro vai te trazer cheiro de frutas frescas, gosto de panetone e uma energia de renovação gostosa. Dezembro tem a capacidade de nos deixar saudosistas, nostálgicas, melancólicas e simultaneamente esperançosas, planejadoras.

No mês do seu aniversário você sempre vai ganhar umas apresentações pela cidade e a possibilidade de ver gente feliz por aí. Vai ganhar  um dia maior, umas crianças na rua até tarde, umas luzes espalhadas pela cidade e umas músicas repetitivas que grudam na nossa cabeça. De presente para você a vida vai ficar toda brilhosa, vermelha e dourada, mas dentro da sua casa você pode colocar as cores que quiser.

Os sorrisos dos desconhecidos de Dezembro vão te fazer querer sorrir também. E se você quiser dar uma passadinha pela rodoviária nessa época do ano vai ver tanta saudade expressa em abraços que vai querer expressar também. Dezembro vai te dar piadas de pavê, apertões de bochechas e gente dizendo como você cresceu, o que vai ser bem irritante, mas sei que você conseguirá ver o carinho por trás desses atos.

E se tudo der certo, no último mês do ano você também terá uma mãe correndo feito louca dentro de casa, arrumando as uvas e os pêssegos em cestas para a ceia de natal e te ensinando a cortar a melancia em ziguezague e fazer bolinhas com o miolo dela. Vai me pedir um bolo para adoçar o dia 28 e no dia trinta e um vai me ouvir dizendo o quanto eu quero que todos os seus sonhos se realizem… no ano que vai chegar.

Provavelmente no meio de tudo isso você vai rir de mim e dizer o quanto eu sou clichê ou então vai vir junto comigo e se empolgar bobagem toda. Nos dois casos eu prometo te responder com um abraço bem apertado e um cheirinho no pescoço.

Se ainda assim você em um ano ou outro tiver um fim de ano meia boca, a gente se esforça para compensá-lo durante todos os outros meses do ano, pode ser?

Feliz Dezembro para você.

O fantástico da criança e eu

Eu sou uma pessoa muito chata. Acho que talvez eu sempre tenha tido medo de crianças por causa disso. Nunca soube ser legal como elas. Nunca soube como chegar, conversar, interagir com elas sobre mundos imaginários, sobre outras dimensões, sobre esses lugares, esses bichos, esses seres que as crianças conhecem tão bem e nós não.

Nunca me animei a ler Harry Potter, nem as Crônicas de Nárnia. Também não sou nada chegada em romances em geral e mesmo as histórias fantásticas que gosto, gosto pela parte lúcida delas (O Labirinto do Fauno, por exemplo).

Mas aí veio a Rita. E quem já cuidou de bebês integralmente sabe que uma coisa mágica acontece com a gente: De repente, regredimos. É como se tudo o que está ligado a nossa infância estivesse armazenado no nosso inconsciente e de repente isso vem a tona. Não que a gente passe a se lembrar, mas isso se manifesta de alguma forma. A gente consegue se comunicar mais de maneira não-verbal, olhar nos olhos da nossa criança e compreende-la, colocá-la para dormir muito provavelmente da forma que nós gostávamos de dormir quando criança.

E nesse meu retorno eu tenho descoberto uma nova forma de se ver o dia-a-dia. Primeiro me interessei surpreendentemente por uma série chamada Once Upon a Time e amei. Eu que só costumava falar comigo mesma, agora ando cantando para alguém. Canto as músicas que conheço sobre borboletas, sobre gatinhas manhosas e sobre heróis cujos cavalos agora só falavam inglês.

Ontem no meio das nossas brincadeirinhas clássicas bateu um ventinho. E movida por esse ventinho eu joguei sobre nós duas uma coberta que, por coincidência, é cheia de bolinhas coloridas. Foi aí que a mágica entrou de vez na minha vida. Eu vi então que quando quisermos podemos fazer isso: Viver sob um céu de bolinhas coloridas, onde a gente pode cantar e imitar pássaros com as nossas mãos.

Estou pouco a pouco aprendendo a olhar esse outro lado do mundo: O que simplesmente não existe. O que a gente forma juntas, montando, imaginando, viajando no conhecido até que ele não faça mais sentido algum, ficando assim do nosso jeito.

Para ajudar meu sobrinho de seis anos ainda tem me dado uma mãozinha no assunto: “Tia Paula, o que acontece se um tiranossauro rex brigar com um urso polar?” olha, eu não sei, mas pelo jeito tenho avançado (ou regredido?) a um nível de não se importar em passar horas imaginando para descobrir.

Confiança

Rita já está grandinha. Com oito meses ela engatinha e passa um tempão brincando no tapete. Persegue os brinquedos e as outras coisas que não são tão brinquedos assim, como controles, telefones, livros, etc.

Acho que são sinais grandes de independência. A gente fica até um pouco assustada quando, pela primeira vez, vê que colocou a cria para brincar em um lugar e ela já está lá do outro. Provavelmente querendo brincar com algo que não pode.

Ela também já consegue se levantar sozinha. Se apoia na mesinha, na caixa de brinquedos, no sofá e fica ali de pezinha. Olhando a vida sob outra perspectiva. Deve ser interessante poder mudar de ângulo quando isso não é corriqueiro na vida da gente. Dá um trabalho danado, exige um esforço tremendo das pernas, dos braços e da força de vontade para ver a vida diferente no comecinho assim.

Até gravei um vídeo disso. Mas ficou virado. Sou excelente com tecnologia, não?

Mas, assim como eu, antes de ir para o meu primeiro show, aos onze anos de idade, abracei a minha mãe como se fosse a última vez que nos víamos, ela ainda se abraça a essa ideia de proteção chamada: Eu.

Se eu trouxer no colo, chegar e soltá-la no tapete é choro na certa. Eu preciso sentar junto. Ela passa um tempo sentada na minha perna, com a cabeça encostada no meu ombro, só olhando. Depois vê alguma coisa que a atrai. E aí já senta no chão, mas não vai lá brincar. Eu tenho que trazer o brinquedo para perto dela e mostrar que é bom. Apresentá-los como se fosse a primeira vez.

Passa um tempo ali, se revezando entre olhar o que tem em volta, brincar com o que eu entreguei e me abraçar. Até que vai. Vai engatinhar, mexer nas coisas, descobrir sozinha. E aí eu posso sair.

Quando consegue ficar de pé se apoiando em algum objeto passa um bom tempo ali. Mas não sabe descer. Então quando cansa começa a ficar nervosa, dá um chorinho de quem precisa de ajuda, uns gritinhos de quem não vê saída. Até que eu chego por detrás dela e dou minhas duas mãos para ela segurar. Ela nem precisa me ver, sabe que são minhas mãos que estão ali e que vão ajudá-la a caminhar para onde ela quiser. Pronto, está aberto o sorriso e as balbucias de alegria.

Independência é uma delícia. Mas quando a gente sabe que tem uma mão para segurar e um colo para sentar fica muito mais fácil engatinhar em direção a ela.

Breast is Best – Parte III

Quem me deu o leite é quem vai tirar.

Hoje é o primeiro dia da semana mundial da amamentação, portanto, vou me obrigar a escrever a terceira – e última – parte da sequencia sobre amamentação que tanto procrastinei.

Minha cria já está com sete meses (olha só!) e aí é claro que já começaram a me perguntar “mas ela ainda mama no peito?” “quando você vai parar de amamentar?” e imaginem o choque quando eu respondo: Quando ela quiser parar de mamar.

Acho muito estranho esse conceito de “parar de amamentar”, como assim? Um belo dia você vai simplesmente negar o peito para a sua criança? Sem motivo algum? Claro, é muito diferente quando não se tem leite, quando vai passar um tempo fora, quando não pode em tal horário. Tudo isso é muito normal e acho até que, dependendo da idade, a criança compreende. Não se pode ter tudo. Agora, você está ali, com o peito cheio, o filho pedindo e você simplesmente resolve não dar? Como assim? Por que?

Porque já está muito grande, porque já passou da hora, porque criança grande mamando é feio, porque nessa idade o leite é só uma aguinha com açúcar (oi q?), são muitos os motivos que nos dão para negarmos o peito a nossa cria, soa até algo de extrema necessidade. Mas não é. Muito pelo contrário. Até um ano de idade o leite é o que mais sustenta a criança, o resto dos alimentos é complementar (área na qual minha Rita está indo muito bem, por sinal, come feijão, beterraba, mandioquinha, banana, maçã… mas isso é assunto para outro texto).

Particularmente, entendo que o leite do meu peito não é meu. Eu não o tinha. Minha filha, ao nascer, foi quem trouxe ele. Ela emprestou para o meu corpo o alimento que é, por direito, dela. Então que razão eu tenho de em dado momento simplesmente resolver que vou pegar para mim? Que não vou mais devolver? Quem trouxe o mamá foi ela e só ela pode mandá-lo embora.

E é claro que a nossa vida não se resume a dar peito. A gente tem que sair, tem que viajar, trabalhar, enfim, muitos motivos nos levam a não poder estar ali disponível para quando eles querem. Mas aí com um pouquinho de conversa e muito carinho nós e nossa cria conseguimos passar por esses momentos sem grandes traumas. Agora, enquanto estivermos pertinho, mãozinha e mamá, eu deixarei os dois se encontrarem.

As histórias que ouço de mães que foram pelo caminho do desmame natural sempre me emocionam. Desde as que, com onze meses, de repente resolveram que queriam ficar só abraçadas com o peito, mas não mamar. Até as que, com quase três anos, falaram “Tá difícil de sair né mamãe? Acho que não quero mais não, pode guardar”.

Quando eu tiver minha própria história, de quando minha filha resolveu mandar seu leite embora, venho contar para vocês :)

Primeira vez que Ritinha pegou o peito.

Eu vou reativar

Pois é, eu me fui. Muitos percalços presentearam minha gravidez e eu fiquei sem ânimo até para escrever. Daí sumi.

Desde que a Rita nasceu eu ando com muita coisa para falar. Acontece que pensei ter perdido o timing – depois de tanto tempo sem aparecer, convenhamos, é até vergonhoso voltar – para escrever aqui. Mas refletindo sobre a questão eu conclui brilhantemente que: foda-se. Quero voltar, vou voltar.

Esse vai ser um post curto, só para informar o retorno mesmo. Até porque a bonitinha já está dormindo há umas 3h e eu aqui, que vergonha. Como se estivesse com horas de sono sobrando para desperdiçar assim.

Mas já que estou aqui, quero aproveitar para contar que hoje pela primeira vez ela segurou um livrinho daqueles de banho e levou na boca. E lambeu. E mamou o livro. E tinha gosto de sabão e ela fez cara feia.  E sorriu para mim.

E agora eu vou lá cheirar o cabelo dela e dormir abraçadinha que já passou tempo demais.

Eu já sei fazer sozinha

Foi lá no Rio Grande do Norte, em Natal. O médico já havia dito fazia um mês que eu poderia estar sentindo alguma coisa, mas ainda nada. Eu a compreendo, ela de certo queria que fosse especial e já deve ter percebido que eu não sou nada fã desse inverno paranaense. Então ela esperou eu ir viajar para Natal, meu primeiro nordeste, em férias fora de época com minha mãe para aproveitar um passeio enquanto não tenho que correr atrás de dois pézinhos gordos que estão por vir.

Eu tinha passado a manhã toda na praia e voltei para o hotel com o enorme sono que ela me faz sentir. Antes de decidir dormir coloquei Alceu Valença para tocar, coisa que faço corriqueiramente no Paraná, mas convenhamos, depois de um banho de mar no nordeste fazia muito mais sentido. Desliguei a música e – depois de pedir mil desculpas para minha mãe, por não poder acompanhá-la no almoço – deitei na cama sem habilidade alguma, já que ainda estou me adaptando a esse novo corpo, e acabei de bruços. Eu ia virar, mas a preguiça e, claro, a vontade de dormir de bruços (já que é como dormi a vida toda) eram tantas que acabei ficando um tempo ali, quietinha e de bruços. E aí ela chutou.

Foi um chute de quem pensou que aquele era o momento certo, ou de quem queria dizer “mãe, você está me esmagando, levanta!” e a opção c é de que foi só um chute, um esbarro de alguém que estava tentando ficar mais confortável nesse apertado útero que não permite que ela se espreguice direito. Mas o fato é que a Rita chutou. Não eu, a Rita. Não minha barriga, a Rita. Foi a Rita.

Aquele chute declarou a existência de um ser vivo, inteiro. Minha filha, Rita, que embora ainda esteja dentro de mim, já é independente o bastante para chutar as paredes do meu útero sozinha. Ela deixou de ser uma extensão do meu corpo, saiu do mero campo visual da minha barriga. Agora somos nós duas.

Esse blog não é só sobre a gravidez. É sobre mim, sobre a Rita, sobre nós, o mundo que nos cerca e a nossa vida juntas.